Cuidar vai muito além de curar. Essa é a essência dos cuidados paliativos, uma abordagem cada vez mais reconhecida no cenário da saúde, especialmente diante do envelhecimento populacional, do aumento de doenças crônicas e da busca por um atendimento mais humano e centrado no paciente. Em 2025, com a evolução do debate sobre dignidade, qualidade de vida e bem-estar, os cuidados paliativos assumem um papel crucial — inclusive nos planos de saúde.

Muitas pessoas ainda associam os cuidados paliativos à fase terminal da vida, como se fossem um último recurso para pacientes sem chance de cura. No entanto, essa visão está ultrapassada. Os cuidados paliativos são, na verdade, um conjunto de práticas e intervenções que visam aliviar o sofrimento físico, emocional, social e espiritual de pessoas com doenças graves ou ameaçadoras da vida, em qualquer estágio da enfermidade.

Neste artigo, vamos entender o que são os cuidados paliativos, por que eles são tão importantes no sistema de saúde atual, como os planos de saúde estão se adaptando para oferecer essa assistência e quais são os desafios e avanços nesse campo essencial para a dignidade humana.

O que são cuidados paliativos e por que eles importam

Cuidados paliativos são uma forma de assistência focada no alívio do sofrimento e na promoção da qualidade de vida de pacientes com doenças crônicas complexas, progressivas ou em estágio avançado. Isso inclui câncer, doenças neurológicas degenerativas, doenças cardiovasculares, respiratórias e outras condições de longa duração.

O objetivo dos cuidados paliativos não é acelerar nem adiar a morte, mas sim garantir conforto, dignidade e autonomia para o paciente, respeitando seus desejos e promovendo apoio integral à família. Eles envolvem o controle da dor, o tratamento de sintomas como fadiga, náuseas e falta de ar, além do suporte psicológico, social e espiritual.

É uma abordagem multidisciplinar, que reúne médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas, nutricionistas e outros profissionais, todos comprometidos com o bem-estar integral do paciente. Os cuidados paliativos podem ser oferecidos em hospitais, clínicas, unidades especializadas e até no domicílio, conforme a necessidade e o desejo do paciente.

A importância dessa abordagem se torna ainda mais evidente quando entendemos que muitas doenças não têm cura, mas todas têm tratamento. E o tratamento, nesse caso, não é apenas da doença, mas do sofrimento humano em suas múltiplas dimensões.

Quando os cuidados paliativos devem começar

Ao contrário do que muitos imaginam, os cuidados paliativos não devem ser oferecidos apenas no fim da vida. O ideal é que sejam iniciados junto com o tratamento da doença, tão logo o diagnóstico de uma condição grave ou incurável seja confirmado. Isso permite um acompanhamento mais contínuo e eficaz, reduz o sofrimento ao longo da jornada e melhora significativamente a qualidade de vida do paciente.

Estudos mostram que pacientes que recebem cuidados paliativos precocemente apresentam menos dor, menos depressão, menos internações desnecessárias e até maior sobrevida, em comparação com aqueles que só recebem esse tipo de cuidado em estágios finais.

Além disso, iniciar o cuidado paliativo com antecedência possibilita que o paciente participe ativamente das decisões sobre seu tratamento, planeje o futuro de forma consciente e compartilhe seus desejos com a equipe de saúde e seus familiares.

O papel dos planos de saúde nos cuidados paliativos

A inclusão dos cuidados paliativos nos planos de saúde ainda é um desafio em muitos aspectos. Embora a legislação brasileira reconheça a importância da assistência paliativa, não há, até o momento, uma regulamentação clara e específica por parte da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) sobre o tema. Isso significa que os planos podem adotar abordagens diferentes quanto à cobertura, critérios de indicação, locais de atendimento e profissionais envolvidos.

Na prática, o que se observa é que muitos beneficiários enfrentam obstáculos para acessar cuidados paliativos completos, principalmente em casa ou fora do ambiente hospitalar. Muitos planos ainda se concentram em tratamentos curativos, hospitalares e procedimentos de alta complexidade, negligenciando a importância do conforto e da dignidade em fases delicadas da vida.

Apesar disso, algumas operadoras vêm evoluindo e criando programas específicos de cuidados paliativos, com equipes multidisciplinares, protocolos de acolhimento, suporte psicológico para familiares e até visitas domiciliares. Esse movimento, ainda que restrito, aponta para um amadurecimento do setor diante da demanda crescente.

Vale destacar que o acesso aos cuidados paliativos também está ligado à educação dos próprios profissionais de saúde e dos beneficiários. Muitas vezes, o paciente e sua família não sabem que têm direito a esse tipo de abordagem, ou os próprios médicos hesitam em indicar o cuidado paliativo por receio de serem mal interpretados.

Os desafios na ampliação da assistência paliativa

O principal obstáculo para a consolidação dos cuidados paliativos nos planos de saúde é a falta de diretrizes nacionais específicas e obrigatórias sobre a cobertura. Sem regras claras da ANS, muitas operadoras interpretam a assistência paliativa como um serviço opcional, e não como um direito do paciente.

Outro desafio é a formação dos profissionais. Ainda há carência de equipes treinadas para atuar com sensibilidade, técnica e empatia em cuidados paliativos. Essa formação exige mais do que conhecimento clínico — exige habilidades de comunicação, escuta ativa e trabalho interdisciplinar.

Além disso, o modelo de remuneração atual dos planos, baseado na prestação de serviços curativos e quantitativos, dificulta a valorização de práticas que, embora menos “procedimentais”, são mais humanizadas. Mudar essa lógica é fundamental para ampliar o acesso a cuidados que realmente fazem diferença no fim da vida — não apenas em números, mas em significado.

Por fim, há a questão cultural. Muitos ainda veem a morte como um tabu, e falar sobre ela é desconfortável. Isso dificulta conversas antecipadas sobre desejos, limites e preferências, o que acaba empurrando decisões difíceis para momentos de crise, em que o sofrimento é maior e a autonomia do paciente pode estar comprometida.

Avanços e perspectivas futuras

Apesar dos desafios, há avanços importantes. Em 2025, diversos hospitais já contam com equipes de cuidados paliativos integradas ao fluxo assistencial, inclusive em UTIs. A pandemia da Covid-19 também despertou maior atenção para a importância de garantir conforto e dignidade mesmo em situações críticas.

Além disso, a discussão sobre saúde baseada em valor — que prioriza resultados significativos para o paciente, e não apenas a quantidade de procedimentos — tem aberto espaço para a inclusão dos cuidados paliativos como um componente essencial da assistência de qualidade.

A tendência é que, com o envelhecimento da população e o aumento de doenças crônicas, os cuidados paliativos deixem de ser exceção para se tornarem parte natural do cuidado contínuo. Isso exige um novo olhar dos planos de saúde, das instituições e da sociedade sobre o que realmente importa em saúde: não apenas prolongar a vida, mas garantir que ela seja vivida com conforto, autonomia e dignidade.

Os cuidados paliativos representam uma das formas mais nobres e humanas de cuidar da saúde. Eles reconhecem que, mesmo diante de doenças incuráveis, ainda é possível tratar — tratar a dor, o medo, a solidão, a angústia. Tratar o ser humano, em sua totalidade.

Incluir essa abordagem nos planos de saúde é um passo necessário para garantir um sistema mais justo, compassivo e centrado no paciente. E mais do que uma responsabilidade das operadoras, é uma responsabilidade de todos nós: profissionais de saúde, familiares, gestores e sociedade.

Cuidar do fim da vida com respeito e empatia é, também, cuidar da forma como vivemos todos os dias. E os cuidados paliativos são, cada vez mais, uma ponte entre a técnica e o afeto. Entre a medicina e a humanidade.

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